O Antonio Pereira. A Falsidade Ideológica. Acordo de Não Persecução Penal. A Conselheira Mônica Autran e a Cassação da Delegação

 



Não deu para o Antonio Pereira: a conselheira do CNJ, Mônica Autran Machado Nobre, cassou a decisão do Tribunal de Justiça do Estado do Pará que havia designado Antônio José de Vasconcelos Pereira como responsável interino do Cartório do Único Ofício de Tracuateua. Na decisão, Mônica Nobre considerou o fato de Pereira ter firmado Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) no âmbito de Procedimento Investigatório Criminal, com confissão formal de prática de conduta tipificada, em tese, como falsidade ideológica, relacionada ao exercício da atividade notarial. 

“Ocorre que, conforme dito anteriormente, o Tribunal de Justiça do Estado do Pará prestou informações detalhadas, trazendo elementos novos e relevantes, especialmente quanto à situação funcional, disciplinar e penal do delegatário designado, os quais ensejam reavaliação pontual da tutela de urgência, exclusivamente quanto ao pedido subsidiário de afastamento do atual interino, sem qualquer recomposição da situação funcional do requerente.” Pontou a magistrada na decisão. Leia abaixo o documento na íntegra:

PROCESSO: 0008696-78.2025.2.00.0000

CLASSE: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO (11891)

POLO ATIVO: ANDRE QUEIROZ MERGULHAO

REPRESENTANTES POLO ATIVO: KARINA SANTOS REBELO - PA34987

POLO PASSIVO: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ - TJPA

DECISÃO

Trata-se de Procedimento de Controle Administrativo, com pedido liminar, apresentado por André Queiroz Mergulhão contra ato da Presidência do TJPA que, por meio da Portaria n. 1094/2025-GP, cessou sua designação interina no Cartório do Único Ofício de Tracuateua e nomeou o delegatário Antônio José de Vasconcelos Pereira.

Em decisão, foi indeferida a tutela de urgência (id n. 6313407).

Após intimação do Tribunal de Justiça Paraense, foi juntada manifestação (id n. 6338798).

Em resumo, o TJ requerido informa que a vacância decorreu da renúncia do antigo delegatário e que o requerente, na condição de escrevente substituto, foi designado apenas de forma precária e temporária, por prazo máximo de seis meses, em conformidade com a Lei no 8.935/94, o Código Nacional de Normas e a orientação do STF na ADI no 1.183, não havendo direito subjetivo à sua permanência ou recondução na função.

Dentes outros pontos, o Tribunal esclarece que, antes do término da interinidade exercida pelo requerente, a Corregedoria-Geral instaurou procedimento regular para escolha de delegatário interino, com chamamento de titulares de serventias contíguas e ampla instrução, afastando a alegada preclusão das manifestações de interesse.

Diz ainda que, após análise dos requisitos previstos no art. 71 do Código Nacional de Normas, teriam sido examinadas eventuais pendências administrativas, financeiras e disciplinares dos interessados, tendo sido consideradas inexistentes ou sanadas aquelas atribuídas ao delegatário nomeado, inclusive no que se refere a sistemas eletrônicos e a notícia de fato criminal resolvida por acordo de não persecução penal, sem condenação transitada em julgado.

Conclui o TJ que, ultrapassado o prazo máximo da interinidade exercida por substituto, a designação deve recair sobre delegatário titular, nos termos do art. 69 do Provimento CNJ no 149/2023, sendo regularmente aplicado o critério de desempate da menor distância entre a serventia vaga e a serventia de origem, o que justificou a escolha do delegatário da Comarca de Bragança.

Vieram os autos conclusos. É o relatório.

DECIDO.

A controvérsia, neste momento processual, não mais envolve o direito do requerente à interinidade, questão já definitivamente afastada, mas sim a regularidade da manutenção do delegatário atualmente designado, à luz dos princípios da moralidade administrativa, idoneidade moral, segurança institucional e confiança pública nos serviços extrajudiciais.

Em decisão anterior, foi indeferida a tutela de urgência, especialmente por se constatar, em juízo preliminar, a impossibilidade jurídica de retorno do requerente à interinidade, diante da vedação constitucional à perpetuação de interinidades exercidas por substituto não concursado, nos termos da ADI no 1183/DF.

Ocorre que, conforme dito anteriormente, o Tribunal de Justiça do Estado do Pará prestou informações detalhadas, trazendo elementos novos e relevantes, especialmente quanto à situação funcional, disciplinar e penal do delegatário designado, os quais ensejam reavaliação pontual da tutela de urgência, exclusivamente quanto ao pedido subsidiário de afastamento do atual interino, sem qualquer recomposição da situação funcional do requerente.

Compulsando-se as informações prestadas pelo TJPA, verifica-se que:

a) o delegatário ANTÔNIO JOSÉ DE VASCONCELOS PEREIRA firmou Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) no âmbito de Procedimento Investigatório Criminal, com confissão formal de prática de conduta tipificada, em tese, como falsidade ideológica, relacionada ao exercício da atividade notarial;

b) embora o ANPP não constitua condenação penal transitada em julgado, trata-se de instrumento de justiça penal negociada que pressupõe reconhecimento da materialidade e da autoria, não se confundindo com arquivamento por inexistência de ilícito. 

Com efeito, tais circunstâncias somente vieram ao meu conhecimento, de forma incontroversa, no curso do PCA, não tendo sido objeto de apreciação prévia pelo quando do exame inicial da tutela de urgência.

É certo que o Provimento CNJ no 149/2023 não prevê, de forma expressa, o ANPP como causa automática de impedimento para designação interina. Todavia, também é pacífico no âmbito deste Conselho que a aferição da idoneidade moral para o exercício interino de serventia extrajudicial não se resume a critérios meramente formais, devendo considerar o impacto institucional da permanência do delegatário, ainda que de forma provisória.

A interinidade, embora precária, envolve gestão de delegação estatal sensível, com repercussão direta na fé pública, na segurança jurídica e na confiança social.

Nesse contexto, a presença de confissão formal por crime diretamente relacionado à atividade notarial, ainda que sem condenação, é suficiente para instaurar, ao menos em sede de liminar, dúvida objetiva e relevante quanto à idoneidade, apta a justificar medida acautelatória, especialmente quando não há risco de descontinuidade do serviço, a serventia permanece vaga, inexiste direito subjetivo do requerente e a medida tem caráter estritamente provisório e

preventivo. 

Portanto, deferimento parcial da liminar, nesse ponto, não importa juízo definitivo de desvalor, tampouco antecipação de penalidade, mas sim medida de prudência administrativa, compatível com a atuação cautelar do CNJ.

Pelo do exposto, em juízo de retratação parcial, e exclusivamente quanto ao pedido subsidiário, defiro parcialmente a liminar apenas para suspender os efeitos da Portaria no 1094/2025-GP, exclusivamente no que se refere à designação do Sr. Antônio José de Vasconcelos Pereira como responsável interino do Cartório do Único Ofício de Tracuateua.

Reitere-se que tal medida não enseja a recondução do requerente André Queiroz Mergulhão à interinidade, em observância à decisão do STF na ADI no 1183/DF e ao art. 69 do Provimento CNJ no 149/2023.

Na oportunidade, determino, ainda, que o TJPA, no prazo de 10 (dez) dias, proceda à designação provisória de novo responsável interino, observados rigorosamente os critérios do Provimento CNJ no 149/2023, a inexistência de impedimentos objetivos e a aferição reforçada de idoneidade moral.

Intimem-se.

À Secretaria Processual para as providências necessárias.

Brasília/DF, data registrada no sistema.

MÔNICA AUTRAN MACHADO NOBRE

Conselheira

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