O Peter Liu. Os 3 Milhões de Seguidores. A Doméstica. O Trabalho Escravo e a Condenação

 


O influenciador de medicina chinesa Peter Liu foi condenado pela justiça do trabalho por manter, por 30 anos, uma mulher em trabalho análogo à escravidão em Campinas (SP). O réu que possui 3 milhões de seguidores nas redes sociais terá de pagar R$ 1,2 milhão em obrigações trabalhistas, sendo fixado R$ 400 mil a título de danos morais. Cabe recurso. A decisão da 10ª Vara do Trabalho de Campinas foi proferida em 13 de agosto de 2025, mas o g1 teve acesso aos autos neste sábado (13). 

Além de Liu, foram condenados a mulher do influenciador e seus dois filhos, de forma solidária, pois todos se beneficiaram da força de trabalho não remunerada. Em nota, a defesa de Peter Liu e sua família afirmou que a acusação não possui fundamento, que a caracterização das condições análogas ao trabalho escravo não procede, e que a ação foi motivada pela filha do réu, por conta de desavenças familiares - veja abaixo.

A justiça reconheceu o vínculo de emprego como empregada doméstica pelo período de 1º de abril de 1992 a 31 de agosto de 2022, determinando o pagamento de salários, horas extras, férias remuneradas, 13º salários, além de multas e indenizações pelo período. O juiz determinou ainda que, após trânsito em julgado, sejam expedidos ofícios ao Ministério Público Federal (MPF) e à Polícia Federal para apuração do crime de redução à condição análoga à de escravo, previsto no art. 149 do Código Penal, que prevê pena de reclusão de 2 a 8 anos. Segundo a ação, a mulher foi induzida a sair de seu estado natal, Pernambuco, com a promessa de que tão logo o casal de origem chinesa se regularizasse no Brasil, ela passaria a receber salários, o que não aconteceu.

A vítima conta que desde 1992 está em Campinas, onde ficava à disposição de Peter Liu e a família por 24 horas, sem nunca ter recebido salário, férias ou descanso semanal, sendo mantida em ambiente impróprio. A rotina exaustiva, segundo depoimentos, começava às 4h da madrugada, quando preparava o café da família Liu, e depois seguia para a clínica, onde permanecia, por vezes, até às 22h30. Inicialmente, conta que dormia em um sofá, e depois em uma maca em condições degradantes dentro de uma clínica irregular que o influenciador mantinha. 

A alimentação, muitas vezes, era fruto de doação por algum paciente da clínica. Ainda de acordo com a ação, a mulher rompeu o vínculo com a família em 2022, após receber ameaças da mulher de Liu, e buscou auxílio jurídico. Atualmente, convive na casa da filha de Peter Liu, de quem cuidou desde a infância, e com quem criou laços - a filha, inclusive, disse em depoimento que assim que tomou ciência da situação, interrompeu qualquer forma de prestação de serviços e a incentivou que a mulher procurasse a justiça.

Peter Liu, a mulher e o filho apresentaram contestação conjunta no processo, e negaram a ocorrência de trabalho análogo à escravidão, defendendo a tese de que "a relação com a empregada sempre foi de natureza familiar e de assistência gratuita, tendo sido a autora acolhida ‘como se fosse alguém da família’". Os réus negaram ainda qualquer restrição de liberdade, e afirmaram que a habitação sempre se deu em condições dignas, e que a ação seria uma manobra da mulher junto com a filha para obter vantagens financeiras indevidas. 

Peter Liu e os demais réus, no entanto, não negaram que jamais houve pagamento de salários. Na contestação, argumentaram que “sempre que a autora precisava de algum valor, os réus forneciam o correspondente ou mesmo poderia ela separar da receita diária”.

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